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terça-feira, 19 de novembro de 2013

Quando Você Pode Esquecer Sua Comida no Forno!

        É ótimo poder saber do que é feito e como reage aquilo que cozinhamos. Dessa forma podemos adicionar novos componentes e fazer novas combinações esperando alcançar o máximo em sabor e textura.

        O físico Benjamin Thompson (Conde Rumford), bastante conhecido por seus trabalhos em termodinâmica, também pode ser considerado o "inventor" do fogão (meados de 1750). Até então as carnes eram assadas em espetos sobre o fogo. Simples (?) assim. Mas ao cozinhar sua carne em seu assador de batatas, sob temperaturas bem menores do que o do fogo direto, ele percebeu que baixas temperaturas davam melhores resultados em termos de textura e que aquela bela perna de cabrito ficava muito mais suculenta. Talvez esse possa ser considerado, inclusive, o primeiro experimento científico, controlado, com comida!

Fogão de Rumford (fonte: hearthcook.com)


       Mas é claro que o seu ponto de vista tinha que ser provado! E durante uma festa (belo jeito de provar um ponto) ele preparou as pernas de cabrito num canto da casa, assados sobre o fogo direto e, no outro canto da casa, ele fez as pernas de cabrito em seu assador de batatas, sob baixa temperatura. No final ele esperava ver em qual canto da casa havia sobrado mais carne. E qual não foi a surpresa quando ele percebeu que sobrou bem mais carne assada no canto do assador de batatas... Moral da história: você pode ser um ótimo cientista de renome e ainda assim estragar tudo!


Perna de Cabrito (fonte: http://chestofbooks.com)


      De fato, assar a carne sob baixas temperaturas, por mais tempo, oferece uma carne bem suculenta e macia. Isso porque as enzimas responsáveis por deixar a carne mais molinha continuam atuando por mais tempo, já que a temperatura no interior da carne continua mais baixa, por mais tempo!

      E quais são essas enzimas? Uma delas é a calpaína que enfraquece as proteínas de suporte que mantêm os filamentos de contração do músculo no lugar. Ou seja... temperaturas abaixo de 40oC, enzimas mais ativas, proteínas de suporte mais fracas, carne mais macia! Outras enzimas importantes neste processo são as catepsinas, que também atuam sobre os filamentos de contração muscular e as moléculas de suporte, quebrando-as. Além disso essa enzima também enfraquece o colágeno no tecido conectivo, dissolvendo-o em gelatina durante o cozimento, fazendo a carne ficar mais macia e suculenta. Este processo enfraquece a pressão de esmagamento que o tecido conectivo exerce durante o aquecimento, conservando a umidade (as moléculas de água) no interior da carne.

      Bom, mas por que então as pessoas ainda preferiram a carne assada no fogo direto? Porque após assar a perna de cabrito em baixa temperatura, Benjamin deveria ter submetido a carne (mesmo que por um período menor de tempo) à alta temperatura para que a carne tostasse, adquirisse aquela cor bronze que deixa a superfície crocante e deliciosa!!! Mas isso é assunto para outro post... =)


Churrasquinho Delícia!


      


         

sábado, 2 de novembro de 2013

A Gastronomia Molecular e Como Será a Comida de Amanhã?

A gastronomia molecular é uma tendência. Não é à toa que os famosos chefs que baseiam sua cozinha neste tipo de gastronomia aparecem sempre nos primeiros lugares dos afamados rankings. E aqui no Brasil não é muito diferente, como é o caso do Alex Atala. Entre os top 10 do mundo! E muita gente torce o nariz quando houve falar nesta expressão. Mas será que essa tendência é feita apenas de espuminhas, nitrogênio líquido e gelatinas ou será que pode nos ajudar a entender melhor o jeito como preparamos nossos alimentos e o que acontece nesse momento?



Restaurante D.O.M. do chef brasileiro Alex Atala. Eleito o 6o. melhor restaurante do mundo em 2013 pela revista inglesa Restaurant.

Apesar de a ciência dos alimentos não ser uma novidade, a verdade é que continuamos cozinhando alimentos básicos como tomate e batata do mesmo jeito que as pessoas já cozinhavam centenas de anos atrás. Mas, então, o que está faltando? Será que falta algum tipo de entendimento, de conhecimento, além do simples preparo e, se sim, é a gastronomia molecular que pode suprir essa necessidade até na minha, na sua, na nossa cozinha? Esse trend se aplica a nós? Vai mudar o jeito como nos alimentamos?


                  O “molecular” da gastronomia molecular tem a mesma definição do “molecular” para a biologia molecular. A física e química são o centro desse conhecimento e esse entendimento pode mudar o jeito que você cozinha. Ou não? Vejamos.


Em 1783, Antoine Lavoisier, considerado pai da química moderna, estudou e publicou seus experimentos sobre a preparação de caldo de carne. Exato, caldo de carne! Em seus estudos ele procurou avaliar a qualidade do caldo de carne a partir de sua densidade. Na mesma publicação – e o que eu acho o mais importante desta discussão – ele ponderou: “Não importa se você considerar o mais familiar dos objetos, as coisas mais simples, é impossível não ser surpreendido em ver como as ideias são vagas e incertas, e como, como conseqüência, é importante fixá-las por experimentos e fatos”. Você sabe cozinhar, ok. Mas você sabe realmente o que está fazendo?

Análise da preparação do caldo de carne (massa x tempo) a partir da água fria e água quente.
Cansados de ouvir falar em lendas culinárias e cansados do – mesmo – jeito que as pessoas continuavam cozinhando, em 1995, o vencedor do prêmio Nobel de Química, Jean-Marie Lehn e o físico-químico Hervè This criaram o primeiro grupo de gastronomia molecular, na França, justamente para começar a entender os fenômenos culinários.

Por exemplo, se você pega uma receita que diz: “Adicione um pouco de vinagre à água do cozimento do ovo e assim ele não irá se romper”. Você vai fazer isso? Isso está correto? Nós podemos usar as ferramentas da biologia, da química e da física para responder à essa questão. O conhecimento gerado vai servir para corrigir possíveis erros, melhorar o processo de cozimento ou gerar novos pratos e modos de preparação.

                  Esse texto soa muito “frio” pra você? OK. É inquestionável o papel da “arte” e do “amor” no preparo dos alimentos. E, talvez, a ciência seja incapaz de um dia explicar totalmente o papel destes elementos, mas pode ajudar! Por exemplo, a biologia evolutiva pode contribuir com o conhecimento a respeito do comportamento humano associado ao hábito de cozinhar seus alimentos .

                  De qualquer forma esses dois componentes são essenciais para o principal motivo de se cozinhar: deliciar seus convidados!


Fontes –
This, H. Food for Tomorrow? EMBO reports, 2006.
This, H., et al. Lavoisier and Meat Stock. Comptes Rendus Chimie, 2006.